Embora menos comum, o câncer de pâncreas é particularmente letal, com taxas de sobrevivência muito baixas
Um dos tumores mais temidos devido a sua agressividade e rápida evolução, o câncer de pâncreas tem má fama, pois não apresenta sintomas na fase inicial e avança agressivamente, mas isso não quer dizer que a doença não tenha tratamento.
No momento em que surge uma nova esperança – uma vacina terapêutica contra o câncer de pâncreas bastante promissora – o jornal Folha de Piracicaba convidou o oncologista Fernando Medina, diretor do CECAN- Centro do Câncer da Santa Casa de Piracicaba, para esclarecer sobre o tema.
O oncologista nos esclarece que o câncer de pâncreas é o tumor maligno que se origina no pâncreas, um órgão localizado atrás do estomago e responsável por produzir enzimas digestivas e hormônios, como a insulina. Este tipo de câncer é particularmente agressivo e muitas vezes diagnosticado em estágios avançados, o que dificulta o tratamento e reduz a taxa de sobrevivência.
A incidência do câncer de pâncreas, segundo Medina, varia em diferentes partes do mundo. “De acordo com a organização mundial da saúde (OMS) e a Agência Internacional para Pesquisa do Câncer (IARC), o câncer de pâncreas é a 12ª forma mais comum de câncer no mundo, com cerca de 460.000 casos novos diagnosticados em 2018”. A taxa de incidência é mais alta em países desenvolvidos com Estados Unidos da América e na Europa Ocidental.
No Brasil, de acordo com o Ministério da Saúde serão diagnosticados 11.090 casos novos de câncer de pâncreas no ano de 2024, sendo 5.780 em homens e 5.310 em mulheres. “Embora menos comum, o câncer de pâncreas é particularmente letal, com taxas de sobrevivência muito baixas. Muitas vidas foram ceifadas por esta doença, lembrando Steve Jobs, Patrick Swayze, Luciano Pavarotti, Gabriel Garcia Márquez e outros”.
Desafios do Câncer de Pâncreas
Os desafios ainda são muito grandes. “O câncer de pâncreas é uma doença complexa e desafiadora, com vários obstáculos que dificultam o diagnóstico, tratamento e prognóstico”. Entre os principais desafios, podemos destacar:
A seguir, Medina explana sobre Diagnóstico Precoce, Tratamentos, Prognóstico, Outros desafios, Avanços e perspectivas, Ações para superar os desafios e Resultados
Diagnóstico Precoce
Sintomas inespecíficos: Na fase inicial, o câncer de pâncreas geralmente não apresenta sintomas específicos, o que dificulta o diagnóstico precoce. Os sintomas podem ser vagos e semelhantes a outras doenças, como dor abdominal, náuseas, vômitos e perda de peso.
Falta de exames eficazes: Não existe um exame de rastreamento eficaz para o câncer de pâncreas. Os exames disponíveis, como ultrassom abdominal e tomografia computadorizada, podem não detectar o tumor em estágio inicial.
Tratamento
Tumores agressivos: O câncer de pâncreas é um tumor com alto grau de malignidade e capacidade de se espalhar rapidamente para outros órgãos.
Resistência a tratamento: As células do tumor pancreático podem ser resistentes à quimioterapia e radioterapia, tornando o tratamento mais desafiador.
Cirurgia complexa: A cirurgia para remover o tumor pode ser complexa e de alto risco, devido à localização do pâncreas e à proximidade de outros órgãos importantes.
Prognóstico
Baixa taxa de sobrevida: O câncer de pâncreas tem uma das taxas de sobrevida mais baixas entre os tipos de câncer. Em média, apenas 9% dos pacientes com diagnóstico de câncer de pâncreas sobrevivem por cinco anos.
Dificuldade na detecção de recidiva: O tumor pode reaparecer após o tratamento, o que dificulta o prognóstico e o acompanhamento dos pacientes.
Outros desafios
Falta de conhecimento sobre a doença: Ainda há muito a ser pesquisado sobre as causas, desenvolvimento e mecanismos de resistência do câncer de pâncreas.
Impacto psicológico: O diagnóstico de câncer de pâncreas pode ter um impacto significativo na saúde mental dos pacientes, causando ansiedade, depressão e medo.
Avanços e perspectivas
Apesar dos desafios, há progressos na pesquisa e no tratamento do câncer de pâncreas. “Novas tecnologias, como a terapia-alvo e a imunoterapia, estão mostrando resultados promissores em estudos clínicos. A pesquisa também está focada no desenvolvimento de melhores métodos de diagnóstico precoce e acompanhamento dos pacientes”.
Ações para superar os desafios
Investimento em pesquisa: É fundamental investir em pesquisas para aumentar o conhecimento sobre a doença e desenvolver novos métodos de diagnóstico, tratamento e prevenção.
Campanhas de conscientização: Aumentar o conhecimento sobre o câncer de pâncreas e seus sintomas pode ajudar na detecção precoce e melhorar o prognóstico dos pacientes.
Apoio aos pacientes: É importante oferecer apoio aos pacientes com câncer de pâncreas e seus familiares, tanto físico quanto emocional, para ajudá-los a lidar com os desafios da doença.
Com o investimento em pesquisa, Medina ressalta o desenvolvimento de novas tecnologias e conscientização da população, espera-se que os desafios do câncer de pâncreas sejam superados no futuro, proporcionando melhores chances de cura e qualidade de vida para os pacientes.
Vacina contra o câncer de pâncreas
A vacina contra o câncer de pâncreas, destaca Medina, em estudos iniciais utiliza a tecnologia de RNA mensageiro (mRNA), semelhante às vacinas contra COVID-19. Ela funciona da seguinte maneira:
“O mRNA da vacina codifica proteínas específicas do tumor pancreático.
Quando a vacina é injetada no paciente, as células do corpo capturam o mRNA e o traduzem em proteínas. Essas proteínas “ensinam” o sistema imunológico a reconhecer e atacar as células cancerígenas do pâncreas. A resposta imune do corpo pode ajudar a eliminar o tumor ou prevenir seu crescimento”.
Resultados iniciais
Os resultados iniciais dos estudos com a vacina contra o câncer de pâncreas são promissores, diz:
- Em um estudo de Fase 1, a vacina foi segura e bem tolerada por pacientes com câncer de pâncreas em estágio avançado.
- A vacina induziu uma resposta imune robusta em 50% dos pacientes.
- A resposta imune durou até três anos após a imunização.
- Alguns pacientes apresentaram regressão do tumor ou estabilização da doença.
Os resultados mais recentes do estudo sobre a vacina de mRNA para o tratamento do câncer de pâncreas foram apresentados no Congresso Anual da American Association for Cancer Research (AACR) em San Diego pelo Dr. Vinod Balachandran, cirurgião-cientista de câncer de pâncreas do Memorial Sloan Kettering Cancer Center (MSKCC). “Esses resultados mostraram que a vacina candidata a câncer ativou células imunes que persistiram no corpo até três anos após o tratamento em certos pacientes. Além disso, uma resposta imune induzida pela vacina correlacionou-se com um risco reduzido de o câncer retornar. Foi observado também que, em 8 pacientes que tiveram uma resposta imune ativada pela vacina de mRNA, 6 desses pacientes não apresentaram retorno do câncer durante o período de acompanhamento. Em contraste, o câncer retornou em 7 dos 8 pacientes cujos sistemas imunológicos não responderam à vacina durante o período do estudo. Embora esses dados sugiram que a vacina investigacional pode ter estimulado uma resposta duradoura das células T, os pesquisadores ainda não sabem se as vacinas causaram o atraso no retorno do câncer; investigar essa questão é um objetivo de um ensaio clínico de fase 2 randomizado em andamento”.
O racional, alerta o oncologistapara, é combinar a vacina de mRNA com o atezolizumab, um inibidor de checkpoint imunológico, baseia-se na hipótese de que a vacina pode ensinar as células T a reconhecer e atacar as células cancerígenas específicas do paciente, enquanto o atezolizumab pode ajudar a superar a supressão imunológica no microambiente do tumor, permitindo uma resposta imune mais eficaz contra o câncer. A combinação dessas terapias visa potencializar a resposta imune antitumoral e melhorar os resultados clínicos para os pacientes com câncer de pâncreas.
“É importante ressaltar que os estudos ainda estão em fase inicial e que a vacina ainda não está disponível para o público em geral. Mais pesquisas são necessárias para confirmar a segurança e a eficácia da vacina em um número maior de pacientes”.
Portanto, revela, a vacina de RNA mensageiro (RNAm) contra o câncer de pâncreas é uma área de pesquisa promissora, mas ainda está em estágios iniciais de desenvolvimento. “O conceito é semelhante ao das vacinas de RNAm para COVID-19, como as da Pfizer-BioNTech e Moderna. Essas vacinas funcionam ensinando o sistema imunológico a reconhecer e combater o vírus que causa a COVID-19. Da mesma forma, uma vacina de RNAm para o câncer de pâncreas visaria ensinar o sistema imunológico a reconhecer e atacar as células cancerígenas do pâncreas”.