Texto: Gabriela Cupani
Levantamento mostra que epidemia dessas drogas tem impacto direto em acidentes fatais; no Brasil, envenenamento acidental acontece com analgésicos e antitérmicos
Quase metade (47%) das mortes acidentais por envenenamento em crianças nos Estados Unidos ocorre por ingestão de medicamentos opioides. Remédios vendidos sem receita, como analgésicos e antialérgicos, ocupam o segundo lugar, com 14%, seguidos de drogas ilícitas e acidentes com monóxido de carbono, entre outros. A maior parte das mortes se deve a overdoses acidentais, mas há também reações adversas e erros nos tratamentos. As principais vítimas, segundo o estudo, são crianças com menos de um ano de idade.
Os dados são de um levantamento recém-publicado no periódico Pediatrics que avaliou 731 casos fatais em 40 estados do país entre os anos de 2005 e 2018. Segundo os especialistas, os casos refletem uma consequência da epidemia de opioides que assola os EUA e facilita a exposição das crianças a esses medicamentos. Tanto que a participação dessas drogas nas intoxicações infantis saltou de 24% para 52% em 13 anos.
No Brasil, no entanto, a situação é outra, segundo o médico Carlos Augusto Mello da Silva, presidente do Departamento de Toxicologia e Saúde Ambiental da Sociedade Brasileira de Pediatria. De acordo com o especialista, aqui os principais envolvidos nas intoxicações são os analgésicos e antitérmicos, como paracetamol e ibuprofeno, descongestionantes nasais e produtos de limpeza doméstica, como o hipoclorito de sódio.
Mesmo que a maioria dos casos seja leve, os envenenamentos domésticos também requerem uma atenção especial dos pais e cuidadores. Segundo um levantamento da Sociedade Brasileira de Pediatria feito em 2018, em duas décadas houve 245 mil casos de intoxicação por exposição inadequada a medicamentos – cerca de 37 vítimas a cada dia – com 240 mortes. Os dados são do Sistema Nacional de Informações Tóxico-Farmacológicas (Sinitox) da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz).
No Brasil, os acidentes se concentram na fase pré-escolar, na faixa de 1 a 4 anos, quando os pequenos já andam e têm mais autonomia e, seja por curiosidade ou por imitação, acabam ingerindo acidentalmente substâncias nocivas deixadas ao alcance. Nos mais novos, os acidentes acontecem por erros na dosagem ou por usar remédios de forma inadequada ou sem prescrição médica.
Quando suspeitar de uma intoxicação
Os médicos alertam que uma intoxicação dá sinais repentinos, ao contrário das doenças comuns da infância que costumam se instalar aos poucos, com sintomas aumentando gradativamente.
Isso deve acender uma luz vermelha”, diz Mello da Silva.
O especialista afirma que é importante ficar atento se a criança apresentar estados extremos, por exemplo, sonolência excessiva ou muita agitação ou ainda se tiver perda de tônus (a criança fica ‘mole’). Se aparecem muitos sintomas ao mesmo tempo, envolvendo órgãos diferentes, como vômito, tontura, sonolência, é importante procurar imediatamente um pronto-socorro.
Dicas para prevenir acidentes com medicamentos:
- Guardar remédios (assim como produtos de limpeza e outras substâncias tóxicas) fora do alcance das crianças, em armários altos e fechados – de preferência com chave. Não guardar na cômoda, na mesa de cabeceira ou no balcão do banheiro.
- Guarde os remédios imediatamente após usar.
- Não tomar medicamentos na frente da criança pois ela pode querer imitar.
- Nunca colocar remédios em outra embalagem, nem produtos de limpeza em garrafas PET, por exemplo.
- Administrar o remédio com a luz acesa para não errar a dosagem. Pelo mesmo motivo, usar seringas descartáveis (sem agulha) para medir a dosagem de xaropes e suspensões.
- Nunca usar medicamentos sem prescrição médica. Não use remédios indicados por outras pessoas, nem prescritos para outra criança. As doses dependem do peso e são muito específicas. Há remédios para adultos claramente contraindicados em crianças, como descongestionantes nasais com nafazolina.
- Descartar sobras de medicamentos.
- Em caso de emergência, entre em contato com o Disque-Intoxicação, um serviço da Anvisa: 0800-722-6001. Tenha em mãos o rótulo do produto e/ou medicamento.