As meninas são as mais acometidas pela condição que desenvolve prematuramente os caracteres sexuais
Entre as consequências da pandemia de COVID-19, o número de casos de puberdade precoce tem chamado atenção de médicos e pesquisadores por ter sofrido um aumento de até cinco vezes durante o isolamento social.
Um estudo desenvolvido por um grupo de pesquisadores do programa de pós-graduação em Endocrinologia da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) teve como objetivo avaliar o impacto da pandemia na incidência de puberdade precoce. O grupo realizou uma revisão sistemática de artigos publicados nas maiores bases de dados da literatura médica e encontraram 23 estudos publicados de 11 países diferentes, que incluíram em conjunto mais de 250.000 crianças com diagnóstico.
“Foi identificado aumento médio de 2,5 vezes e há estudos que apontam até 5 vezes nos casos de puberdade precoce em meninas durante a pandemia de COVID-19 em comparação aos dados pré-pandemia. Esse achado não foi detectado nos meninos, nos quais a frequência de puberdade precoce é muito menor”, explica Amanda Cheuiche, médica endocrinologista pediátrica pelo Hospital de Clínicas de Porto Alegre (HCPA) e uma das pesquisadoras do estudo da UFRGS.
A Puberdade Precoce Central (PPC) é o desenvolvimento prematuro de caracteres sexuais secundários antes dos 8 anos de idade em meninas e antes dos 9 anos em meninos, resultante do aumento da secreção do hormônio liberador das gonadotrofinas (GnRH), o qual estimula a secreção hipofisária dos hormônios luteinizante (LH) e folículo-estimulante (FSH), determinando a produção precoce de esteroides sexuais pelos ovários e testículos. A puberdade precoce é considerada uma doença rara, sendo de 15 a 20 vezes mais frequente em meninas quando comparadas aos meninos.
Nas meninas, os primeiros sinais são o surgimento do broto mamário e um pequeno aumento do volume das mamas. Nos meninos, o primeiro indício é o aumento dos testículos, o que costuma ser seguido pelo crescimento do pênis e aparecimento de pelos pubianos.
As causas da puberdade são estudadas há décadas, e mesmo assim não há consenso entre os estudiosos para a causa exata deste quadro, mas a pandemia trouxe alguns pontos que foram observados. “Alguns fatores que podem estar associados a essa maior incidência como o ganho de peso, aumento do comportamento sedentário e do tempo de tela, assim como o estresse psicológico durante o período pandêmico”, destaca a especialista.
O tratamento da puberdade precoce central é feito com agonistas do GnRH, como a leuprorrelina. Estes medicamentos têm como objetivo bloquear a evolução puberal e promover a completa ou parcial regressão dos caracteres sexuais secundários, diminuir a velocidade de crescimento e a progressão da idade óssea. Seu efeito permite reduzir ou evitar a perda estatural, além de prevenir desajustes psicossociais relacionados à antecipação puberal.
Em agosto de 2022, o Ministério da Saúde aprovou a atualização dos Protocolos Clínicos e Diretrizes Terapêuticas (PCDT) com avaliação da Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias no Sistema Único de Saúde (Conitec), que incorporou o medicamento ao Sistema Único de Saúde (SUS). A Conitec recomendou o tratamento de PPC em pacientes com idade igual ou superior a 2 anos de idade. Além dos benefícios de sua posologia, que possibilitam maior adesão ao tratamento.
A incorporação ao SUS é um avanço, pois significa mais conforto às crianças que precisam fazer o tratamento, uma vez que as injeções precisavam ser administradas mensal ou trimestralmente, e geravam maior número de consultas, assim como filas para receber a medicação.