Sentada numa cadeira simples de madeira de espaldar baixo, com os olhos fechados e as mãos estendidas sobre o colo, ouvia o murmúrio quase inaudível da reza. Mal compreendia as palavras.
A mulher segurava-lhe as mãos e, com a outra, sobre sua cabeça, benzia-lhe. Às vezes, usava raminhos de arruda, de vassourinha ou a água benta.
Em poucos minutos, finalizava a prece com um sinal da cruz e, com um sorriso amigável, anunciava o término da sessão de benzimento.
As pernas estavam inchadas, avermelhadas e quentes havia muitos dias. Ana, temendo algo mais grave, resolvera buscar o auxílio da benzedeira Teresinha, em Ártemis. Saía de casa, todos os dias, pedalando sua bicicleta Monark Barra Forte. Deveria retornar, diariamente, até obter a cura.
Ana Rosilei Rodrigues Araújo, a Anona, fora retratada nestas crônicas, outrora. Quis trazê-la, de novo, para mostrar sua simplicidade e sua resistência às adversidades e a realidade na abstinência ao tabagismo.
O benzedor, o curador ou o rezador exerce atividade destinada a curar uma pessoa doente. Aplicam-se, sobre ela, gestos acompanhados por alguma erva ao mesmo tempo em que se reza uma prece.
Constitui importante elemento da cultura popular brasileira e tem suas origens no sincretismo religioso. Ao contrário dos curandeiros, dos charlatães e dos aproveitadores, a benzedeira é alguém da própria comunidade, que recebeu seus ensinamentos dos antigos, de forma oral e não cobra por sua atividade.
Ana, imbuída de fé e acostumada a resistir às intempéries da vida, recorreu à benzedeira Teresinha para cura-lhe as pernas inchadas. Noutra vez, provou-se forte diante do escândalo que envolveu membros da sua família.
O filho Chiquinho, em julho de 2023, descobrira, da pior maneira, a traição de sua esposa: a outra mulher, cujo marido engraçara-se com a sua, chegou alardeando para quem quisesse ouvir.
Houveram brigas, discussões e entreveros. Ana ficara extremamente entristecida e, mais ainda, preocupada com o neto Miguel, filho do casal separado.
Naquele dia fatídico, não aguentou tamanha emoção, pediu ao filho um cigarro, acendeu-o e o fumou. Fazia mais de um ano desde que havia largado o tabagismo. Sentiu vergonha e medo de pôr tudo a perder.
Ana teve um lapso, um deslize, que não resultou em recaída. Esta seria o retorno ao consumo regular de cigarros, mesmo que em quantidades menores que a anterior à cessação.
Segundo dados de uma metanálise publicada no JAMA — Journal of the American Medical Association —, aos 6 meses de tratamento, 70% das pessoas encontrar-se-ão em situação de recaída.
O médico e o paciente devem trabalhar na prevenção. Há fatores pessoais e interpessoais envolvidos.
Exemplos de fatores pessoais: estado emocional negativo e sentimentos de depressão, de tristeza, de tédio ou de luto. Como fatores interpessoais, citam-se: a influência de outras pessoas e situações conflituosas no casamento, na amizade ou no emprego; a pressão social indireta quando se frequenta um local com alguém ou um grupo que está fumando e, por fim, quando existem relações conturbadas no ambiente doméstico ou no trabalho.
Nesse trabalho de prevenção, torna-se fundamental ensinar os pacientes a reestruturar seus pensamentos negativos sobre os lapsos para não os encarar como fracasso ou como falta de força de vontade.
Quando a vi em meu consultório e ouvi seus relatos, fiz um pequeno ajuste na medicação anti-hipertensiva — um dos remédios que tomava pode provocar edemas em até 10% dos pacientes.
Troquei-o, mas a deixei pensar que fora a fé que lhe trouxera a cura.