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Ídico Luiz Pellegrinotti

Professor universitário

O Beijo de Rui Barbosa

O excelente jurista, só para ficar nessa seção, pois, como é do conhecimento, o eminente causídico brasileiro foi exemplar em diversas áreas em que atuou.

Delimitando ainda mais, situarei a defesa de Rui as arbitrariedades cometidas contra os desafetos do executivo no início da República, em que a Suprema Corte, de mãos dadas com o executivo deliberava para alegrar o Presidente – (1891 – 1894) – Floriano Peixoto, marcado por duas revoltas:

Revolta Armada e Revolução Federalista, situações em que o eminente causídico se pós a contestar as arbitrariedades do governante e as decisões inconstitucionais dos membros da Suprema Corte da época¹. Sem diminuir a importância do Órgão, Rui não via virtù na maioria de sua composição.

A importante ação de Rui Barbosa na Suprema Corte foi com o pedido de habeas corpus, em 18-04-1892, em favor de quarenta cidadãos presos ilegalmente a mando do Presidente Floriano, que instituiu o Decreto 791, de 10 de abril de 1892, o estado de sítio; suspendendo por 72 horas as garantias constitucionais e prendendo todos os envolvidos na alegada sedição.

Floriano, com afirmações para seu benefício, invocava motivos relevantes da salvação pública. Rui Barbosa não se conteve, pois aquilo era um atentado intolerável à legalidade, e como amante da liberdade, não suportando a audácia do violador da Constituição, assumiu resistência ao ato.

Acreditava ser procedente o seu pedido de habeas corpus, pois sustentava a ilegalidade das prisões determinadas pele Decreto 791, em virtude:

a) de terem algumas delas ocorrido antes da decretação do sítio;

b) de se terem outras verificado durante um sítio que não observara ‘as condições essenciais de sua constitucionalidade’;

c) e, finalmente, de se haver outras realizado posteriormente à restauração das garantias suspensas.”

Perante os três pontos acima apontados, Rui expõe sua brilhante defesa alegando que o delito era de sedição e que o Governo sufocara quando mal começava e, ainda, a suspensão de obrigações ou punições aos cidadãos só tem valor após a aprovação e do momento de sua publicação.

Apesar de Rui possuir certeiras argumentações, o Supremo Tribunal, com maioria, nega o pedido de habeas corpus porque é de responsabilidade do Congresso aprovar ou reprovar o estado de sítio declarado pelo Presidente da República, considerando, portanto que antes do juízo político não pode o judiciário apreciar o uso que fez o Presidente e que:

NÃO É DA ÍNDOLE DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL ENVOLVER-SE NAS FUNÇÕES POLÍTICAS DO PODER EXECUTIVO OU LEGISLATIVO.

Contudo, somente o Ministro Piza Almeida votou a favor da petição, com o argumento:

com o estado de sítio o governo pode efetuar prisões, mas levantando o estado de sítio, os cidadãos continuarem presos, sem processos e sem defesa, equivale à imposição de uma pena indeterminada, está em desacordo com art. 80 da Constituição, e contra essa prisão, o remédio é o habeas corpus.

Finda a sessão do julgamento, Rui se encaminhou ao ministro Piza e, com humildade e num nobre gesto, “pediu o consolo de beijar a mão de um justo”. Como escrevia nos principais jornais, dedicou ao ministro um erudito artigo que afirmou:

Toda grandeza desta causa que há de levantar-se na história do meu país como uma altura coroada de luz, quando as misérias de hoje tiverem passado, no momento que leva para o olvido os restos erráticos das paixões dos seres humanos e dos infortúnios dos povos, figurou-se-me humanada naquele homem modesto, silencioso, em cuja fisionomia, suave e triste como as lentes crentes querem que fossem o Salvador, a expressão da timidez e da doçura dir-se-ia um disfarce divino da justiça e da coragem moral. Falei comigo: nesta crise de pigmeus, ainda restam gigantes.

Passados 132 anos, o que vemos é parte da grande mídia, academias, sindicatos e representantes políticos não contestarem, veementemente, decisões injustas de membros da Colenda Suprema Corte de nossa desrespeitada República.

1. Registradas no livro de Rubens Noguera: “O Advogado Rui Barbosa”. Coleção Ensaios Brasileiros – homens e fatos – IV, 2.º edição, 1967.