Fala de Jorginho Mello remete ao movimento ‘O Sul é Meu País’, ativo desde os anos 1990, e levanta questionamentos históricos e políticos sobre a unidade nacional
O governador de Santa Catarina, Jorginho Mello (PL), provocou repercussão nacional ao sugerir, em tom de brincadeira, a criação de um “país do Sul”, durante evento da construção civil em Curitiba (PR), na última quinta-feira (12). Ao lado dos governadores Eduardo Leite (RS) e Ratinho Júnior (PR), Mello afirmou:
“Daqui a pouco, se o negócio não funcionar muito bem lá para cima, nós passamos uma trena para o lado de cá e fazemos ‘o Sul é nosso país’, né?”
Apesar de informal, a fala remete diretamente ao movimento O Sul é Meu País, fundado em 1992, que defende a separação dos estados do Sul (PR, SC e RS) do restante do Brasil e a criação de uma nação autônoma.
As raízes do separatismo
O separatismo sulista não é um fenômeno recente. Ele encontra ecos em revoltas históricas, como a Revolução Farroupilha (RS, século XIX) e a Guerra do Contestado (SC e PR, início do século XX). Esses movimentos, ainda que com diferentes motivações, refletiam insatisfações com o governo central.
O pesquisador Gabriel Pancera Aver, da Universidade Estadual de Londrina (UEL), estuda o tema desde o mestrado. Segundo ele, o movimento atual difere dos episódios históricos ao se basear principalmente em argumentos identitários — “somos sulistas” — e críticas ao pacto federativo. Os defensores do separatismo alegam que a região Sul contribui com altos tributos à União, mas recebe pouco retorno em investimentos públicos.
Contradições e críticas
Para Aver, há um paradoxo nesse discurso. Ele lembra, por exemplo, que a tragédia climática no Rio Grande do Sul em 2024 exigiu forte apoio do governo federal.
“Quando se trata de políticas sociais, o discurso é de autonomia; mas em crises, a solidariedade nacional é invocada”, avalia.
O movimento “O Sul é Meu País” teve maior projeção nos anos 1990, em meio à instabilidade econômica, e ainda mantém núcleos ativos, com baixa adesão popular em plebiscitos não oficiais. A proposta, no entanto, esbarra em um limite constitucional: a Constituição Brasileira, em seu artigo 1º, define a união da federação como ‘indissolúvel’, o que torna qualquer tentativa separatista ilegal.
Governador evita se manifestar
Procurado pela imprensa, o governador Jorginho Mello não comentou a repercussão de sua fala. Nenhum dos outros dois governadores presentes no evento endossou a declaração.