Desde sua estreia em março, a minissérie britânica Adolescência conquistou rapidamente o topo das séries mais assistidas da Netflix. Com uma narrativa intensa e profundamente realista, a produção retrata os desafios enfrentados por adolescentes em um mundo no qual algumas relações estão cada vez mais “virtualizadas”: a pressão constante das redes sociais, o bullying virtual, a exposição excessiva e, sobretudo, o distanciamento dos adultos — pais e educadores — diante dessas vivências da nova geração de jovens.
Mais do que entretenimento, a série lança um alerta urgente sobre a importância do letramento digital e do papel essencial da escola e da família na formação de cidadãos preparados para os desafios do século XXI.
Escola: um espaço para formar cidadãos digitais
A questão sobre a responsabilidade pela educação e preparação dos jovens, não é novo, basta olharmos para o Estatuto da Criança e do Adolescente, lei que já existe há 35 anos e que já tratava sobre a responsabilidade do Estado, da família, das instituições privadas e da sociedade de maneira geral para o desenvolvimento saudável dos jovens.
O que se enfrenta hoje é o desafio de promover essa educação para além das grades curriculares “tradicionais”, preparando esses jovens que já nasceram cercados de tecnologia e com acesso a uma ampla gama de informações a usarem essa tecnologia da maneira que seja mais benéfica para si próprio e para a sociedade.
Diz-se que é um desafio, pois são os adultos, pais e professores, principalmente, que acabam assumindo o papel de educar e orientar os jovens durante seu crescimento e o desenvolvimento de sua personalidade, adultos esses que, na maioria das vezes, também não possuem educação digital suficiente para apoiar os jovens.
Diante dessa falta de preparo da sociedade para lidar com as mudanças comportamentais desses indivíduos que já nasceram cercados de tecnologias e com acesso a uma gama ampla de informações e pessoas através de seus dispositivos eletrônicos, a primeira reação é limitar o uso da tecnologia, quando na verdade, deveria ser instruir sobre as formas corretas de uso e observar se as instruções estão sendo compreendidas, absorvidas e adotadas.
Essa reação social de vedar aquilo com o qual não está preparada para lidar, pode ser observada, por exemplo com o sancionamento da lei 15.100/2025 que proíbe o uso de celulares nas escolas públicas e particulares como medida apta a proteger a saúde mental, física e psíquica das crianças e dos adolescentes.
Mas será que uso da tecnologia, por si só, é um risco à saúde mental, física e psíquica das crianças e adolescentes? Ou estamos, como sociedade, usando esse fundamento como forma de lidar com algo que não entendemos?
O uso da tecnologia por crianças e adolescentes pode sim trazer riscos, mas também pode trazer uma série de benefícios e na sociedade atual, é imprescindível para sua inclusão como cidadão do mundo e o ambiente escolar precisa assumir seu papel como espaço de formação crítica em relação às tecnologias e ao mundo virtual. O uso da internet, das redes sociais e de outras ferramentas digitais faz parte do cotidiano dos alunos — por isso, deve também fazer parte da educação formal.
Não basta ensinar a usar computadores ou aplicativos. É preciso integrar ao currículo temas como privacidade, impactos psicológicos das redes, fake news, comportamento online, direitos e deveres digitais e segurança virtual. A escola tem o dever de promover esse debate com o apoio dos professores, ajudando os jovens a compreender os riscos e responsabilidades de estar online.
Essa formação deve ir além da técnica: é também ética, emocional e social. Ao abordar como a presença digital influencia a autoestima, a identidade e o desenvolvimento dos adolescentes, a escola contribui para a construção de uma juventude mais consciente e preparada para o futuro.
Família: o diálogo como chave para a educação digital
Enquanto a escola ensina, a família educa pelo exemplo e pelo afeto. O papel dos pais no letramento digital dos filhos começa pela escuta. Em vez de apenas impor limites ou controlar o tempo de tela, é necessário abrir espaço para conversas honestas sobre o que os filhos fazem, consomem e como se sentem no ambiente digital.
Na minissérie Adolescência, vemos claramente os efeitos da falta desse diálogo. Os personagens lidam com situações emocionais complexas sem apoio ou compreensão dos adultos — e isso reflete a realidade de muitos jovens. A ausência de orientação familiar pode tornar a experiência digital solitária, confusa e até perigosa.
Estar presente significa acompanhar com empatia, entender os códigos do universo digital e manter uma relação de confiança. Assim, a tecnologia deixa de ser um fator de isolamento para se tornar uma oportunidade de conexão e aprendizado mútuo.
Uma responsabilidade compartilhada
Pais e educadores precisam caminhar juntos. O letramento digital exige parceria entre escola e família, com ações conjuntas como rodas de conversa, oficinas, eventos informativos e uma escuta ativa dos adolescentes.
Ao refletir sobre os dilemas vividos pelos personagens de Adolescência, percebemos que educar no mundo digital é, acima de tudo, uma missão coletiva. Precisamos de adultos mais preparados, atentos e dispostos a aprender com os jovens — porque o letramento digital não é um luxo, é uma necessidade urgente para a formação de cidadãos críticos, éticos e conscientes.
Foto: Banco de Imagem