Considerada a doença do século, a depressão muitas vezes é confundida com um sentimento de tristeza; entender as diferenças é fundamental para o diagnóstico precoce
Tristeza e depressão são estados da alma que se confundem. As diferenças podem ser sutis e até difíceis de perceber, mas quando esses sentimentos negativos duram mais tempo ou são predominantes eles podem indicar que algo não está bem. E como, então, saber se o que temos é realmente uma depressão ou só uma fase ruim que logo vai passar?
Existem dias em que acordamos tristes, temos mais dificuldade para nos levantar da cama, nos sentimos indispostos, queremos ficar sozinhos. Existem dias em que nos sentimos mais sensíveis, com vontade de chorar. Ficamos chateados e frustrados com algum colega ou com nós mesmos. Isso é tristeza. Ficar muito tempo sem nunca enfrentar a tristeza não é humano, não é natural. Ela faz parte da nossa vida.
Porém, quando ela começa mudar as características, se tornar mais intensa e passa a trazer prejuízos em vários aspectos da vida ela se torna patológica, evoluindo para um transtorno chamado depressão. Diferente da tristeza que dura horas e dias, a depressão pode durar semanas, meses e, em episódios graves, até mais de um ano.
Nesse caso, o indivíduo apresenta baixa autoestima, se sente um peso para os outros, não consegue sentir prazer nas atividades que antes lhe faziam tão bem, apresenta problemas de concentração e memória, não consegue se animar em nenhuma situação, apresenta sintomas físicos, pode ter lentidão psíquica e motora, tem dificuldade em encontrar sentido para a vida, não consegue acreditar que sua condição possa melhorar e, em casos moderados e graves, pode ter ideias de suicídio.
Ocorre também uma distorção de pensamento, a pessoa se torna muito negativa, como se ela olhasse o mundo com as lentes da depressão. Uma das grandes diferenças entre ambas (tristeza/depressão) é que na depressão a tristeza e o desânimo são muito mais intensos e duradouros, diferentemente do que ocorre nas respostas normais de tristeza que ocorrem naturalmente ao longo da vida”, diferencia Luciana Paes Lucafó, psicóloga clínica na abordagem junguiana.
Tristeza
A tristeza é um dos sentimentos e emoções humanas básicas. Ela é caracterizada pelo desânimo, falta de disposição e falta de alegria.
Nos sentimentos da esfera da tristeza, Luciana exemplifica a melancolia, saudade, nostalgia, vergonha, impotência, entre outros. O indivíduo pode se sentir triste em diversas situações como: perda de um emprego, no enfrentamento de uma dificuldade, numa situação de rejeição, ao vivenciar um problema familiar, entre outros.
A tristeza faz parte da vivência como ser humano, ela é uma experiência necessária. Como dizia o poeta Vinícius de Moraes: ‘Mas pra fazer um samba com certeza é preciso um bocado de tristeza, é preciso um bocado de tristeza senão não se faz um samba não’. Isso exemplifica que a arte, a criatividade e as transformações pessoais se beneficiam muito da experiência desse sentimento”, conta a psicóloga que ainda esclarece que a tristeza é difícil de ser experienciada, porém possui um potencial transformador.
Ela nos faz parar para prestar atenção em como estamos vivendo, para pensarmos no que nos abalou e a refletirmos sobre nós mesmos.
O indivíduo pode experienciar a tristeza em intensidades diferentes. Normalmente, a tristeza dura horas e dias, mas em algumas situações (mais específicas, como o luto profundo) pode durar semanas ou meses.
Muitas vezes está relacionada com uma perda afetiva recente (rompimentos amorosos, mortes, perda de emprego) e mesmo vivenciando esses períodos às vezes a pessoa consegue se animar. Ela pode apresentar falta de disposição para praticar atividades físicas. Embora dolorida, esse tipo de tristeza não causa maiores danos na vida da pessoa. Nesse caso, a tristeza por si só não é considerada um transtorno mental, mesmo durando um período ela passará.”
Tristeza profunda
É importante frisar que, apesar de a tristeza ser um sentimento natural que todos os seres humanos experimentam ao longo da vida, precisamos ficar atentos quando ela se torna duradoura, pois pode se tornar patológica. Em algumas situações, Luciana detalha que é difícil diferenciar a tristeza da depressão, como no caso do luto intenso. A tristeza faz parte de um processo interno chamado luto (perdas, separações, rompimentos). Mesmo que profundo e marcante o luto intenso é diferente da depressão, que pode muitas vezes ser desencadeada por perdas, daí a dificuldade em diferenciá-los.
Porém, no livro Psicopatologia e Semiologia dos Transtornos Mentais, o autor Paulo Dalgalarrondo (2019, 3ª edição) faz essa diferenciação. Ele destaca que no luto intenso a tristeza está relacionada com a perda e tende a diminuir com o tempo (variável de pessoa para pessoa). A dor vem como ondas associadas a lembranças da pessoa perdida. O sujeito tem pensamentos sobre o que ele poderia ter feito para a pessoa que partiu, se questiona como conseguirá viver sem ela. Já na depressão, a tristeza e o humor deprimido abrangem mais do que a perda, eles são constantes em relação a quase tudo. No episódio depressivo o pensamento típico é sobre a falta de sentido da vida, sobre culpa e sobre o peso que representa para os outros. No caso do luto intenso, que abriga uma tristeza profunda, seria mais adequado o paciente buscar a ajuda psicológica; se houver a necessidade do tratamento medicamentoso, o profissional poderá encaminhar o paciente.”
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Esta e outras matérias você encontra na terceira edição da Revista Us.
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